Mais do que ser conhecido por Machu Picchu, o Peru é a sexta maior economia da América Latina. Com uma população de 33 milhões de habitantes – sendo 72,3% moradores da área urbana e 27,7% da área rural – o país conta com serviços públicos e privados para oferecer acesso à saúde.
Em geral, o país destina 5,5% do PIB de US$ 289,22 bilhões para o setor de saúde. Em 2025, o orçamento da saúde no Peru é de S/251,8 bilhões — aproximadamente R$ 186 bilhões – valor 3% maior do que em 2024 e 194% maior em relação aos dez anos anteriores.
Esse valor deve fomentar o funcionamento de todo o setor, mas, em especial, as cinco instituições principais, que ajudam a compor o sistema misto e fragmentado do país:
- Ministerio de Salud (MINSA);
- Seguro Integral de Salud (SIS), englobado pelo MINSA e voltado à população mais pobre (60% da população);
- EsSalud, o sistema contributivo dos trabalhadores formais (30% da população);
- Programas para as forças armadas e polícia (5%);
- Setor privado, seguro complementar e assistência particular.
Para melhor visualização do sistema completo, confira o esquema estruturado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE):

Através desse modelo, o país conseguiu ampliar sua cobertura de saúde, saindo do patamar de 61% da população em 2009 para 97% em 2023. Nesse sentido, o SIS é um dos principais atores na expansão do acesso à população subatendida.
Mesmo assim, o sistema como um todo ainda sofre limitações pela sua baixa integração, duplicação de serviços e falta de interoperabilidade. Consequentemente, apenas 24% dos peruanos estão satisfeitos com a qualidade do atendimento e serviços médicos no país, de acordo com a pesquisa “Percepciones de los peruanos sobre el sistema de salud”, realizada pela empresa peruana especialista em pesquisa de mercado IPSOS.
Desafios da Saúde
Embora a cobertura tenha se expandido, os níveis de satisfação permanecem baixos. Isso revela desafios estruturais importantes. Segundo análises do Instituto de Avaliação de Tecnologias em Saúde (IETSI) e da Anistia Internacional, o sistema peruano permanece segmentado: são múltiplos subsistemas (MINSA/SIS, EsSalud, forças armadas/polícia e setor privado), cada um com regras, finanças e operadoras distintas, o que gera duplicação de estruturas e ineficiências.
Na prática, essa fragmentação intensifica desigualdades territoriais. Ou seja, a infraestrutura e qualidade dos serviços variam muito entre Lima e as zonas rurais, com atenção precária fora dos centros urbanos.
Além disso, estudos da ENAHO e do Banco Mundial apontam que, apesar de 99% da população estar vinculada a algum seguro, cerca de 70% dos que precisaram de atendimento em 2022 não conseguiram acesso, seja por demora, falta de coordenação entre unidades ou ausência de atendimento fora do horário comercial.
De modo geral, a baixa interoperabilidade entre subsistemas é um dos problemas mais críticos. Isso porque, embora o Peru figure como sexto na América Latina em capacidade digital, ainda carece de sistemas capazes de integrar dados entre MINSA, EsSalud e setor privado, o que prejudica a continuidade dos atendimentos.
Já no que se refere à infraestrutura, conforme dados do MINSA, existe uma variação significativa no número de leitos e unidades de atenção por 10 mil habitantes entre departamentos, favorecendo Lima em detrimento de regiões como Puno ou Loreto.
Há também o subfinanciamento da atenção primária — considerada pilar para eficiência e resolutividade. Embora exista uma agenda de transformação digital até 2030, a implementação ainda está restrita a projetos-piloto.
Em relação ao custo direto para o paciente, segundo uma análise do Banco Mundial, apesar do seguro, muitos peruanos recorrem a pagamentos fora do sistema: cerca de 7 em cada 10 pessoas não conseguem atendimento formal e recorrem à automedicação ou farmácias sem acompanhamento adequado.
Demandas em alta no Peru
As principais demandas de saúde no Peru combinam doenças crônicas não transmissíveis, emergências infecciosas — como tosse convulsa —, riscos ambientais por poluentes e questões associadas à saúde mental.
Em primeiro lugar, quase metade da população acima de 15 anos convive com doenças crônicas — hipertensão, diabetes, obesidade, artrite, problemas cardíacos e câncer —, com prevalência urbana de 44%, em comparação a 37% nas áreas rurais. Além disso, 42% dos adultos relatam múltiplas comorbidades.
No que se refere à saúde mental, 46% da população identifica ansiedade e depressão como principais preocupações atuais, em comparação aos 45% em média na América Latina, segundo pesquisa global da IPSOS. Ainda nesse sentido, o Ministério da Saúde peruano registrou mais de 900 mil casos de ansiedade e depressão entre janeiro e junho de 2024, repetindo a tendência de alta.
Com o aumento do orçamento dedicado, a previsão é que o governo peruano direcione investimentos para algumas áreas específicas do setor de saúde, como prevenção e controle oncológico, saúde materna, desenvolvimento infantil, atendimento emergencial e outras. Vejamos na imagem abaixo:

Mercado privado de saúde no Peru
Para entender um pouco do atual status da saúde privada dos peruanos, eis alguns dados apurados pelo jornal local, Gestión.
De forma resumida, pode-se dizer que o setor privado de saúde fatura S/4,6 bilhões anualmente (aproximadamente R$ 7,06 bilhões) e tem apresentado crescimento contínuo e sustentado ao longo dos últimos anos. O cenário é motivado por fatores tecnológicos, culturais e novas demandas.
Em geral, de acordo com os dados da empresa peruana de consultoria Total Market Solutions (TMS), trata-se de uma taxa média de crescimento anual de 9%, com um crescimento superior – de 10% – entre os anos de 2022 a 2024. Ademais, segundo o Monitor de saúde de 2025 da TMS, a variação de faturamento do setor privado de saúde (clínicas), em comparações ano a ano, é de:
- +22,6% (crescimento) – 2021 vs. 2020;
- -3,8% (queda) – 2022 vs. 2021;
- +10,9% (crescimento) – 2023 vs. 2022;
- +10,2% (crescimento) – 2024 vs. 2023.
Em linha com esse desempenho, o Monitor da TMS também identificou crescimento rápido dos planos de saúde, seguradoras, prestadoras de serviço e outros órgãos.
Para compor esses resultados, 15 grupos empresariais dominam a maior parte do mercado, com ênfase especial nas redes clínicas. Mesmo assim, há ainda três grandes grupos na liderança do setor, em paralelo com outros seis grupos de médio porte e outros seis grupos de operadoras privadas de pequeno porte.
Nesse sentido, os anos de 2023 e 2024 foram importantes para consolidar boa parte desses grupos, que abriram novas unidades e expandiram algumas já existentes. Os analistas da TMS esperam a entrada de três novos grupos nesse mercado ainda em 2025.
A visão favorável para o setor privado, tanto em relação à consolidação quanto ao crescimento futuro, está associada às mudanças de tendências fomentadas pela entrada de capital estrangeiro. Entre outras transformações, há melhorias em tecnologia (como tomografia computadorizada e ressonância magnética), infraestrutura e avanço da descentralização da oferta de serviços – que até o momento ainda está concentrada em Lima, capital do país.
Por fim, a empresa de consultoria destacou ainda a variação na demanda de consultas por especialidade ao longo dos anos. Esses dados também estão representados em uma tabela divulgada pelo jornal Gestión, com base nas informações da TMS.

Portanto, o cenário da saúde no Peru é marcado por avanços em cobertura, crescimento do setor privado e investimentos crescentes, mas ainda esbarra em entraves estruturais que comprometem a equidade e a eficiência do sistema.